terça-feira, 1 de maio de 2012

Resolução do caso prático de 24-04-2012

Antes de começar a resolver o caso prático, importa indicar quais são as principais actuações administrativas relevantes nesta situação. São elas a delegação de poderes do Ministro da Economia no Secretário de Estado do Turismo, a posterior subdelegação de poderes do Secretário de Estado do Turismo no Director-Geral do Turismo, o pedido de concessão do subsídio de 200 000 euros por António ao Director-Geral do Turismo, o pedido de emissão de um parecer feito pelo Director-Geral ao Instituto de Promoção Turística, a proposta de indeferimento do pedido feita pelo Director-Geral do Turismo ao Secretário de Estado do Turismo, a análise do pedido de António pelo Secretário de Estado do Turismo, a audiência da Câmara Municipal e o posterior deferimento das pretensões de António pelo Secretário de Estado do Turismo.
Primeiro que tudo, importa salientar que o decreto-lei X/2003 é legal, uma vez que o nº1 do artigo 16º da Lei Orgânica do XIX Governo afirma que o Ministério da Economia e do Emprego é o departamento governamental que tem por missão a realização de políticas de turismo e, portanto, segundo este diploma legal, o Ministro da Economia pode conceder subsídios para a instalação de hotéis em edifícios classificados de interesse cultural, uma vez que esta actividade se insere no âmbito das políticas de turismo, que são da competência deste Ministério. 
Analisemos agora a delegação de poderes do Ministro da Economia no Secretário de Estado do Turismo e a subdelegação de poderes do último no Director-Geral do Turismo. Importa antes de mais salientar que o Ministro da Economia, o Secretário de Estado do Turismo e o Director-Geral do Turismo eram órgãos do Ministério da Economia na altura em que a decisão foi proferida.  Contudo, analisando a alínea c) do número 3 do artigo 27º do  Decreto-Lei nº 208/2006, de 27 de Outubro de 2006, verificamos que a Direcção-Geral do Turismo, um serviço do Ministério da Economia e da Inovação, foi extinta em 2006, sendo as suas atribuições de natureza normativa integradas na Direcção-Geral das Actividades Económicas e as restantes no Instituto do Turismo de Portugal, I. P, pelo que, hoje em dia, o órgão em que o Secretário de Estado do Turismo devia subdelegar os seus poderes é, neste caso, o Instituto do Turismo de Portugal. 
Assim sendo, a delegação de poderes do Ministro da Economia no Secretário de Estado do Turismo é válida se se preencherem três requisitos: o órgão delegante ( o Ministro da Economia) deve ter especificado os poderes delegados no órgão delegado ( o Secretário de Estado do Turismo)  ou os actos que o delegado pode praticar ( respeitando assim o referido no número 1 do artigo 37º do Código do Procedimento Administrativo), o acto de delegação foi publicado no Diário da República (respeitando assim o referido no número 2 do artigo 37º do Código do Procedimento Administrativo) e tem de existir uma Lei de Habilitação que permita esta delegação de poderes (nº1 do artigo 35º do Código do Procedimento Administrativo). Consequentemente, se estiverem preenchidos estes requisitos, dado que a delegação de poderes é válida, a subdelegação de poderes do Secretário de Estado do Turismo no Director-Geral do Turismo será também válida, salvo se houver uma disposição legal em contrário ou uma reserva expressa do órgão delegante ou subdelegante ( número 2 do artigo 36º do Código do Procedimento Administrativo). Contudo, a subdelegação de poderes só poderá ocorrer se o Ministro da Economia ( o órgão delegante) puder autorizar o Secretário de Estado do Turismo ( o órgão subdelegado) a subdelegar os seus poderes, de acordo com o estipulado no  número 1 do artigo 36º do mesmo diploma.
Relativamente à consulta feita pelo Director-Geral do Turismo ao Instituto de Promoção Turística depois de António ter formulado o seu pedido de concessão de um subsídio de 200 000 euros para a instalação de um hotel no seu solar de Ponte de Lima, há vários aspectos que deveremos salientar. Primeiro que tudo, existe o dever legal de audiência imposto pelo Decreto-Lei X/2003 do Instituto de Promoção Turística na instrução do procedimento relativo à concessão de subsídios para a instalação de hotéis em edifícios classificados de interesse cultural até ao montante de 500 000 euros pelo Ministro da Economia. Assim sendo, o Instituto de Promoção Turística tinha, de acordo com o número 1 do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo, o direito a ser ouvido no procedimento em causa antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informado, nomeadamente, sobre o sentido provável da mesma.  Neste caso, a audiência do Instituto de Promoção Turística  foi escrita, dado que o Director-Geral do Turismo ( que, segundo o número 2 do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo, pode decidir se a audiência dos interessados é escrita ou oral) pediu um parecer ao mesmo. O pedido de emissão do parecer deve ter sido notificado pelo Director-Geral do Turismo ao Instituto de Promoção Turística para, em prazo não inferior a 10 dias, este dizer o que se lhe oferecer ( nº1 do artigo 101º do Código do Procedimento Administrativo). No parecer, o Instituto de Promoção Turística pôde pronunciar-se sobre as questões relativas ao objecto do procedimento e requerer diligências complementares, bem como juntar documentos (nº3 do artigo 101º do mesmo diploma). O parecer neste caso seria, na falta de disposição expressa em contrário, obrigatório mas não vinculativo ( de acordo com o número 2 do artigo 98º do Código do Procedimento Administrativo).
Analisemos agora o facto de o Director-Geral do Turismo, após a emissão do parecer contrário à transformação do solar em hotel,  ter decidido não despachar o pedido e a proposta feita ao Secretário de Estado do Turismo para indeferir o mesmo.
Surge aqui antes de mais uma invalidade material, uma vez que o facto de o Director-Geral do Turismo, apesar de não ter despachado o pedido, requereu o indeferimento das pretensões de António ao Secretário de Estado do Turismo sem deixar de ter em conta que o autor do pedido era seu inimigo pessoal há muito tempo. Ora, esta situação constitui uma violação do princípio da imparcialidade, que, segundo o número 2 do artigo 266º da Constituição da República Portuguesa e o artigo 6º do Código do Procedimento Administrativo, deve nortear a Administração Pública no exercício da função administrativa. Neste caso, sendo o Director-Geral do Turismo inimigo pessoal de António há muito tempo, este deveria ter pedido dispensa de intervir no procedimento, de acordo com a alínea d) do nº1 do artigo 48º do Código do Procedimento Administrativo.
Por outro lado, surge-nos aqui uma invalidade orgânica, uma vez que o órgão competente para tomar a decisão neste caso em concreto continua a ser o Director-Geral do Turismo, e não o Secretário de Estado do Turismo, uma vez que, de acordo com o artigo 40º do Código do Procedimento Administrativo, a subdelegação de poderes só se extinguiria neste caso por revogação do acto de subdelegação pelo Secretário de Estado de Turismo ( o órgão competente para revogar este caso, de acordo com o nº2 do artigo 39º do mesmo diploma) ou por caducidade, resultante de se terem esgotado os efeitos do acto ou da mudança de titulares dos órgãos subdelegante ou subdelegado. Nenhuma destas situações ocorreu aqui e, dado que também não houve avocação ( ou seja, o Secretário de Estado do Turismo não chamou a si a competência para decidir no caso concreto), é o Director-Geral do Turismo o órgão que continua a ser competente para decidir sobre a concessão do subsídio a António. No entanto, como o Director-Geral do Turismo devia pedir escusa neste caso por ser inimigo pessoal de António, caberia ao seu substituto legal ( nº1 do artigo 41º do Código do Procedimento Administrativo) decidir neste caso em concreto ou, não havendo substituto legal, caberia a decisão ao inferior hierárquico mais antigo do titular a substituir, o Director-Geral do Turismo ( de acordo com o nº2 do artigo 41º do Código do Procedimento Administrativo).
Relativamente à audiência da Câmara Municipal de Ponte de Lima, já verificámos que esta é interessada na decisão, de acordo com o Decreto-Lei nºX/2003, e, consequentemente, tem o direito a ser ouvida no procedimento antes de ser tomada a decisão final ( de acordo com o número 1 do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo), pelo que a audiência deste órgão não pode ser dispensada no caso em concreto. O Secretário-Geral do Turismo decidiu que a audiência da Câmara Municipal seria escrita (de acordo com o estipulado no número 2 do artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo) e a Câmara Municipal emitiu um parecer favorável à transformação do solar de António em hotel que, salvo disposição expressa em contrário, será obrigatório mas não vinculativo ( de acordo com o nº2 do artigo 98º do mesmo diploma).
Por fim, importa analisar a última actuação administrativa neste caso: a atribuição de um subsídio de 100 000 euros pelo Secretário de Estado do Turismo a António para que o seu solar fosse transformado em hotel.
Apesar da invalidade orgânica que se verifica nesta situação ( como já foi apontado, o Director-Geral do Turismo, e não o Secretário de Estado do Turismo, era o órgão competente para decidir neste caso em concreto, uma vez que a subdelegação de poderes continua em vigor), devemos salientar que, dado que o parecer do Instituto de Promoção Turística é obrigatório mas não vinculativo, este podia ser afastado pelo Secretário de Estado do Turismo na decisão final. Importa analisar também se o princípio da justiça stricto sensu foi respeitado na definição da quantia do subsídio atribuída a António ou se os 100 000 euros concedidos são insuficientes ou uma quantia excessiva para a transformação do solar em hotel ( neste último caso, estaríamos perante uma invalidade material).  
Concluindo, diria a António que existem várias invalidades materiais, procedimentais e orgânicas neste caso, apesar de a decisão final  ( a concessão dos 100 000 euros) lhe ter sido em parte favorável e de a quantia concedida poder ser justa no caso em concreto. 

 Guilherme Gomes 140110022

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