quarta-feira, 2 de maio de 2012

Resolução da Hipótese Prática nº2


Primeiro há que identificar as várias actuações administrativas descritas na hipótese prática. O Ministro da Economia delegou as competências previstas no decreto-lei nº x/2003 no Secretário de Estado do Turismo e este, por sua vez, subdelegou a competência no Director-geral do Turismo.  O pedido de parecer ao Instituto Português do Turismo, a proposta do não indeferimento do pedido por parte do Director-geral, a audição e parecer da Câmara Municipal e a decisão do Secretário de Estado do Turismo são também actuações juridicamente relevantes.

A delegação de poderes é o acto pelo qual um órgão da Administração, competente para decidir em determinada matéria, permite, de acordo com a lei, que outro órgão ou agente (neste caso encontram-se apenas indicados órgãos) pratiquem actos administrativos sobre a mesma matéria. Ora, a delegação de poderes encontra-se subordinada a uma previsão legislativa: se não for esse o caso ela será inválida.

Embora a hipótese prática seja omissa sobre este assunto assumiremos que prevê a delegação de poderes. Assim, para que o acto de delegação seja válido, o órgão delegante deverá especificar os poderes delegados (art. 37/1 CPA) e o acto deverá ser publicado em Diário da República (art 37/2) CPA).

Não existe uma hierarquia administrativa entre o Ministro da Economia e o Secretário de Estado do Turismo mas uma mera subordinação politica deste àquele, embora pertencentes à mesma pessoa colectiva (o Estado). Uma vez que a Secretaria de Estado do Turismo se encontra inserida no Ministério da Economia, não escandaliza a delegação de poderes neste órgão. Apesar de tudo, o Secretário de Estado poderá praticar o acto, uma vez que se encontram preenchidos os requisitos do art. 35/2 CPA. Também este último órgão poderá subdelegar os poderes, desde que autorizado pelo delegante (art. 36/1 CPA) e desde que não haja disposição legal que o proíba (art. 36/2 CPA). Praticada a delegação, só o órgão delegante poderá resolver o caso. Assim, se o órgão delegado tomar uma decisão que o órgão delegante considere inconveniente ou indesejável (como é o caso da decisão do Secretario de Estado, contrariando a decisão tomada pelo Director-geral), este último poderá revogar o acto praticado, no termos do art. 39/2 CPA.

Nos termos do diploma legal deveriam ser ouvidas a Câmara Municipal local e o Instituto de Promoção Turística, o que veio a acontecer mas em diferentes fases do procedimento administrativo, ou seja, a sequência juridicamente ordenada de actos e formalidades tendentes à preparação da prática de um acto da Administração ou à sua execução (FREITAS DO AMARAL): a audiência ao IPT foi feita em fase de instrução e a Câmara Municipal só após a decisão do Director-Geral. Ambas as audiências deveriam ter sido feitas durante a fase de instrução, uma vez que o seu objectivo é a obtenção do maior número de informações possível. A fase de instrução destina-se a averiguar os factos que interessem à decisão final e, nomeadamente, à recolha das provas que se mostrem necessárias (FREITAS DO AMARAL). A prova documental é o principal mecanismo nesta fase, aqui traduzida pelos pareceres do IPT e da Câmara Municipal. Uma vez que é o próprio decreto-lei a exigir um parecer destas duas entidades poderemos assumir que são obrigatórios.

Quanto à sua natureza vinculativa dos pareceres nada poderemos saber a seu respeito uma vez que o caso é omisso neste aspecto (art. 98º CPA), mas em princípio não serão vinculativos, nos termos do art. 98/2 CPA. Se forem vinculativos, o parecer do IPT e da Câmara Municipal deverão ser respeitados e o seu sentido deverá ser o mesmo levado a cabo aquando da tomada de decisão.

A proposta de decisão do Director-geral não é isenta de critica, uma vez que se baseia numa especial relação de animosidade entre este e o particular em causa. O próprio órgão escusou-de de actuar, uma vez que existia uma causa de impedimento nos termos da al. d) do art. 44º do CPA. Apesar de não ter decidido, não deveria ter fundamentado a sua proposta com base na sua relação com o particular, violando um requisito material. Para além disso, a apreciação do mérito da capacidade empresarial de António por parte do Director-geral não deverá funcionar como critério de decisão.

O Secretário de Estado poderá avocar o indeferimento do pedido de António proposto pelo Director-geral, nos termos do art. 39/1 CPA, e levando em conta o parecer positivo da Câmara Municipal, ao invés do parecer negativo do IPT (e não esqueçamos que, uma vez que nada foi dito acerca da natureza vinculativa dos pareceres, se presume que não o são, nos termos do art. 98/2 CPA). Embora o poder de decidir exista ainda na esfera jurídica do Director-geral, o órgão delegante poderia sempre avocar a sua competência.

António deveria ter sido ouvido em sede de audiência dos interessados antes da tomada de qualquer decisão, perfazendo esta omissão uma invalidade procedimental. Assim, e nos termos dos arts 100º e seguintes do CPA, António deveria ter sido informado, no decorrer do procedimento administrativo, do sentido provável da decisão.

Por fim, o Secretário de Estado não deveria ter baseado a sua decisão no facto da decisão do IPT ser inadequada e errada, uma vez que não lhe cabe a si decidir sobre as especificidades técnicas do edifício (algo que apenas poderá ser  avaliado por uma entidade especializada) ou ainda sobre a notoriedade da qualidade das decisões do IPT. O Secretário de Estado deverá apenas decidir com base em critérios de proporcionalidade, adequação e justiça e se a verba atribuída de 100.000€ respeitar estas indicações a sua actuação será válida. Se assim não o for, António poderá disputar a decisão, com fundamento na inadequação da decisão, atendendo às especificades do edifício, do tipo de obras que pretendia fazer e do fim do pedido. Para além disso, o Decreto-lei previa a atribuição de subsídios até 500.000€, não significando necessariamente que os particulares recebessem o mesmo valor inicialmente pedido (sabendo que o pedido poderá ser indeferido): não há qualquer dever legal de atribuir 200.000€ ao particular.  


Beatriz Gil
140110016

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